O jovem e a política

7 de fevereiro de 2019

Por: Mauri Oliveira de Caetité

Como a juventude pode mudar um cenário marcado por corrupção e descrença na democracia?

2020 será ano de eleições no Brasil. E é momento de repensar sobre as demandas da juventude e de que maneira ela pode influenciar nos rumos do país – inclusive na corrida eleitoral. Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) mostram que, em 2018, dos mais de 147,3 milhões de brasileiros aptos a votar, mais de 57 milhões tinham entre 16 e 34 anos. A maioria dessas pessoas cresceu em uma época de interligações motivadas pela tecnologia.

Isto poderia sugerir uma de ideia democratização e menos privações que nas gerações anteriores. Mas muitos jovens não se mostram muito interessados nessa temática. Optam pela indiferença e tomam uma imagem deturpada da política, decorrente de constantes escândalos de corrupção divulgados pelos meios de comunicação nos últimos anos. No entanto, eles podem influenciar o voto de seus familiares e até decidir uma eleição.

Se tomarmos uma referência panorâmica da história brasileira, poderíamos dizer que o mundo falou mais aos jovens, sobre os jovens, do que os ouviu ou os deixou falar.

Nas décadas de 1960 e 1970, foi a luta contra a ditadura militar. Nos anos de 1980, o grito pelas Diretas Já. No início dos anos de 1990, os “caras-pintadas” pediram o impeachment do então presidente Fernando Collor. E, em 2013, com o impulso das redes sociais, criou-se o movimento que dizia que “o gigante acordou”.

Toda essa trajetória nos leva a pensar em ideais que envolvem um emaranhado de decepções e esperanças em relação ao país. Mas, será que eles foram ouvidos? Deixaram-lhes falar? Eles ousam ser teimosamente otimistas quando perguntados sobre o futuro. Me propus a ouvir opiniões.

“Renovar seria como respirar um ar mais puro”

Renan Santos, de 21 anos, é representante da Pastoral Universitária de Caetité, estudante do curso de matemática da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), campus VI, Caetité e militante do PC do B. Ele já esteve em Brasília, conhecendo o Câmara de deputados, através de um programa de estágio participação, um programa voltado a estudantes universitários com o objetivo de estimular a participação democrática e cidadã por meio de atividades que proporcionem conhecimento sobre o Poder Legislativo. Renan expressou a sua definição de ativismo político, baseada numa crença em novas configurações sociais a partir da representação institucional.

“Acreditar em uma renovação seria como voltar a respirar um ar mais puro, vale lembrar que há muitos políticos honestos e comprometidos com o bem comum, mas esse time precisa ser reforçado. Faz-se necessário, portanto, o surgimento de novas lideranças, principalmente jovens, para que assumam os espaços de discussão política e entendam a importância da atuação institucional, que se candidatam e assumam espaços de poder. Precisamos incentivar isso, os jovens são o presente, e dispõem de uma energia transformadora que pode ajudar muito o seu bairro, a sua cidade, o estado e a nação”.

“Mesmo com a ‘caça às bruxas’, nossa esperança e resistência não morrem”

De acordo com Roberta Dias, 26 anos, a atual situação brasileira é marcada por um “processo de alienação” que está a serviço de uma “opressão” operada pelo Estado. Estudante de Geografia da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), campus Caetité, Roberta se tornou participante ativa e engajada politicamente, a partir de discussões e conhecimentos advindos do ambiente universitário. A postura crítica não a impede de manter um sentimento de otimismo em relação ao futuro.

“O processo de alienação da população se dá como um projeto do Estado, para que possamos naturalizar as opressões, de modo a aceitar tudo que nos é imposto. São formas castradoras de uma visão crítica e reflexiva do mundo, e muitos meios são utilizados para tal, como a mídia televisiva, por exemplo. Assim, naturalizamos a violência do Estado e as opressões da classe dominante sobre as minorias, mulheres, negros e negras, índios, LGBT’s, porque acabamos tendo uma visão limitada de nossa realidade”.

“Sentimos a violência e a opressão de perto. Não mais velada, de forma ideologicamente alienada, mas de forma cruel. Porém, a realidade não faz com que percamos o empenho e a esperança de dias melhores, pois, mesmo com a “caça às bruxas”, referindo-me ao extermínio e à crescente onda de fascismo, que nos massacra todos os dias, nossa esperança e resistência não morrem. Somos violentados todos os dias, e muitos de nós acabam mortos por suas lutas. Em 1964, foram milhares de mortos.  E, nos dias atuais, a conta só aumenta, a exemplo da companheira  e vereadora do PSOL,  Marielle Franco, que foi assassinada no Rio de Janeiro. Estamos inseridos em uma guerra silenciosa, onde o estado faz vítimas todos os dias. É um projeto de extermínio, mesmo.  Militantes e ativistas são exterminados, assassinados, e isto nos machuca profundamente, pois, são nossos amigos, irmãos, filhas e filhos que, por lutarem por um futuro melhor, são vitimados.  Hoje, percebo mais ainda a importância da formação de base, do empoderamento feminino, da luta contra o patriarcado, o machismo, o racismo e todos os preconceitos intrínsecos em nossa sociedade. Tenho respeito e admiração ímpar por todos os companheiros de luta, todos os movimentos sociais. Considero que o momento, e este ano mais que nunca, seja de unidade e de muita garra, pois, como disse certa vez o poeta: tentaram nos matar, mas não sabiam que erámos sementes”.

“Debate deve estar pautado para além de forças polarizadas”

Rogério Campos é graduado em ciências sociais, mestre em sociologia, doutor em ciências sociais, professor da UniFG – Centro Universitário e tem experiência na área de Ciência Política, com ênfase em Política Internacional. Campos identifica, como desafio contemporâneo, a superação de uma “crise da democracia”.

A Democracia no Brasil passa por uma crise institucional grave, colocando em xeque toda a construção dos direitos e deveres constituídos com o fim da ditadura, em 1985. Trata-se do maior desafio político que a sociedade tem que enfrentar na atualidade. Apesar das mudanças de cenário em amplo aspecto, a forma de se realizar política no Brasil pouco se alterou desde o passado, criando um descompasso entre o presente e o futuro. É nesse cenário que emerge a importância da participação ativa e consciente da juventude, independentemente de seu alinhamento ou das ideologias que cada vez mais geram dissonância para a construção de um país consciente e justo. O debate sobre o tema deve estar pautado para além de forças polarizadas entre partidos e visões sobre diferentes temas. Deve, sim, ser alinhado para uma reformulação no processo de formação política e novas propostas que sirvam de direcionamento para a consolidação democrática. Ao contrário do que pode ser proposto – para horror de teóricos como Sócrates, Maquiavel, Rousseau e outros –, o fim da Democracia não seria o nascedouro de uma forma nova e mais justa de organização política, mas tão somente o sepultamento do homem político, do cidadão e da sociedade que foi consolidada através de inúmeras lutas por direitos. Cabe aos jovens, detentores da chave para o futuro, reformularem o projeto de Brasil que gostariam. Cabe a eles trazer à tona não mais os velhos símbolos mofados de poder consolidado que se arrastam e impregnam o Congresso Nacional, e sim colocar novas perspectivas e esperanças de uma nação condizente com o Século XXI. A demonização da política é uma tentativa de afastar a sociedade dos centros de decisões, local este que deve ser ocupado e repensado para criarem-se as condições pungentes de um Brasil que precisa ser grande, não sob a óptica dos outros países, mas sim reconhecido e venerado por seu próprio povo. Aos que lá estão, no poder e acima das nuvens, sem enxergar a realidade cruel e desigual que seus cidadãos vivem, aguardando até sua morte para se retirarem de uma vida pública inglória, deve recair a juventude, que criticamente, possa destroná-los, para que seu sepulcro seja apenas político, enterrando velhos métodos que não mais satisfazem ou contemplam a realidade”.

“Renovação não se dará somente através dos embates nas redes sociais”

O cientista político Joscimar Silva, graduado em ciências sociais, mestre em ciências politicas destaca, que a partir de 2013, houve uma retomada da força política da juventude em diversos países do mundo – e, especificamente, no Brasil.

“As mobilizações de 2013, além de algumas pequenas conquistas localizadas de conter o aumento das passagens, colocaram na agenda do debate público o tema da corrupção. Os impactos de mobilizações podem ser diversos, incluindo aspectos negativos, a exemplo da descrença nas instituições políticas, que aumentam após as manifestações de 2013. Ou positivos, como o importante debate sobre a corrupção e a necessidade de uma juventude mais ativa na política. Na política institucional, apesar do habitual discurso de renovação da política, ainda são poucos os espaços institucionais ocupados por jovens nos legislativos e nos governos. Quanto mais importante os cargos, mais difícil é a penetração de jovens nos espaços institucionais de poder, sejam pelas regras de acesso, seja pela cultura política de valorizar líderes mais reconhecidos e com maior visibilidade, recursos financeiros e poder político. Hoje no Brasil, por exemplo, poucos partidos têm presidentes jovens. E, quando têm, muitos desses são filhos ou apadrinhados por políticos mais velhos e poderosos”.

“A maior participação de jovens na política pode nos proporcionar novas formas aos movimentos sociais, novas soluções para a gestão pública e novas formas de fazer política. Potencializar a força da juventude e capacitá-la para a política é uma tarefa urgente para renovar essa prática. E essa renovação não se dará somente através dos embates nas redes sociais (ainda que eles sejam importantes), mas com uma formação crítica e capacitação para transformação de realidades na prática”.

São os jovens que se deslocam milhares de quilômetros em busca de uma voz na capital do país”

A socióloga Géssica Pêra, graduada, mestre e doutora em ciências sociais, professora da UNIFG e que possui experiência na área de movimentos sociais, é otimista quando perguntada sobre a juventude na política brasileira.

“Existe uma construção discursiva que vem trabalhando com a ideia de que a juventude está cada dia mais apática com temas como política ou mesmo movimentos sociais. Acredito que seja uma leitura enviesada, tendo em vista que a juventude carrega consigo uma característica única, o incômodo das coisas dadas, estagnadas. Falar do jovem na política e falar de movimento, é falar de cidadãos que ainda que principiantes no processo democrático , apresentam uma gana por mudança. É certo que muitos destes, seduzidos por discursos sofistas e bem elaborados, acabam sendo arrebanhados por grupos extremistas. Contudo, há que se pensar sobre o papel importantíssimo que estes jovens dão ao fazer político. A juventude é cheia de vida e essa vida se torna alimento de diversos movimentos que temos visto ao longo da última década. São os jovens que se deslocam milhares de quilômetros em busca de uma voz na capital do país, que ocupam universidades em prol de melhorias no ensino, que se organizam e procuram estudar grandes teóricos clássicos para buscar na historicidade, algum sentido de futuro. Eu tenho grande esperança na juventude brasileira e espero que essa esperança seja materializada nos próximos dez, vinte anos”. Fala Voce

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