‘Plea bargain’ de Moro é incompatível com legislação penal, dizem advogados

8 de janeiro de 2019

A decisão do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, de enviar ao Congresso uma proposta para inserir na legislação criminal mecanismo semelhante ao americano ‘plea bargain’ (acordo penal) repercutiu intensamente entre advogados. O dispositivo jurídico permite à pessoa investigada por crime firmar acordo com a Promotoria antes da abertura da ação penal. Moro considera que o ‘plea bargain’ se aplicaria a qualquer crime de furto, assalto, homicídio ou corrupção cometido por uma única pessoa sem o envolvimento de organizações criminosas. Atualmente esse tipo de acordo só se aplica no Brasil a crimes de menor potencial ofensivo como, por exemplo, lesão corporal leve. De acordo com o advogado criminalista e constitucionalista Adib Abdouni, a proposta de Moro para desafogar o Poder Judiciário ‘mostra-se incompatível com o nosso sistema jurídico processual penal, haja vista que um dos pilares da Constituição Federal está fincado exatamente na inafastabilidade da jurisdição, prevista no seu artigo 5.º., inciso XXXV, segundo o qual a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito’. Abdouni sustenta que não existe a possibilidade de se delegar ao órgão acusador, ou seja, ao Ministério Público, a competência exclusiva do juiz de julgar, absolver ou apenar o infrator. Ele destaca que o emprego desse instrumento nos EUA, ‘que não se confunde com a colaboração premiada’, se justifica pelas peculiaridades legais americanas. Vera Chemim, advogada constitucionalista e mestre em direito público pela FGV, avalia que a medida anunciada por Moro é uma versão ‘simplificada’ do atual ‘acordo de colaboração premiada’, previsto na lei que disciplina as organizações criminosas. “Penso que seja um modelo viável para a maior celeridade da Justiça, no que diz respeito à solução de determinados crimes cometidos por uma só pessoa. Não precisará de homologação do magistrado e dará obviamente maior poder e autonomia ao MP, além de ser um método similar ao que é praticado nos Estados Unidos”, diz. Na avaliação de Vera Chemim, caso fosse realmente implantado no país, o ‘plea bargain’ pouparia tempo e dinheiro público. “Se o Ministério Público tivesse maior autonomia para resolver determinados tipos de crimes, sem ter a obrigação de denunciar à Justiça, além de poupar tempo e dinheiro público, ele teria realmente maiores condições de focar seus recursos humanos e tecnológicos na solução de crimes mais graves.” O criminalista e professor de Direito Penal e Processual Penal, Daniel Gerber, acredita que ‘não há necessidade de se revogar ou se alterar as leis já existentes, mas sim, a criação de uma nova legislação que estabeleça o caminho certo a ser seguido nos casos de acordo’. “Tanto é possível, permitido e condicional que o próprio Conselho Nacional do Ministério Público já baixou uma normativa no começo de 2018, requerendo que para crimes cuja pena não ultrapasse os quatro anos, o Ministério Público evite o oferecimento de acusações processuais e tente justamente uma possibilidade de acordo”, diz. “O Juizado Especial Criminal também prevê possibilidades de acordo, e a colaboração premiada nada mais é do que mais uma tentativa de acordo”, segue Daniel Gerber. “O que precisamos cada vez mais é torná-lo uma regra para toda e qualquer espécie de delito ou pelo menos para a maior parte dos delitos.” Para ele, ‘as leis que existem, tanto a Constituição quanto a legislação ordinária, em hipótese alguma proíbem, vedam ou inviabilizam as propostas de ‘plea bargain’.’

Estadão

 

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